Tudo começou numa manhã de sábado. Fim de festa para os jovens e início de jornada para os 21 jovens-a-mais-tempo. Um abraço na velha figueira e nos primeiros passos a paisagem urbana vai se afastando e as belezas do sul da ilha saltam aos olhos. No comando da guia Cirlene, seguimos pela Beiramar Sul, até o Ribeirão da Ilha. Ela nos aponta o caminho, fala da história e da cultura da ilha e orienta o alongamento muscular, no qual é mestre. Cabe também uma oração e uma reflexão a cada dia. O grupo é heterogêneo. Contamos com a presença da mentora deste Caminho, Maria Zilda, que percorre desde 2006 quando o demarcou. Em contraste, algumas debutantes nesta atividade, como Adriana, Gisele, Clara e Selma. Paciente e dedicada, é Selma quem fecha o pelotão e garante que todos cheguem bem.
Engana-se quem pensa que a trilha é passeio. Tem alto grau de dificuldade. Exige muita atenção, o uso do cajado e a mão do companheiro para vencer as encostas e longas escadarias de pedras irregulares. Um empurrãozinho por traz às vezes é bem-vindo. Mas ao alcançar o topo e contemplar as praias aos nossos pés, tudo vale a pena: a brisa penteando os cabelos; as ondas batendo nas rochas e despejando sua espuma na areia; a Mata Atlântica bem preservada; pássaros, flores e o céu azul, muito azul. Todas estas belezas são capturadas pelas câmeras atentas. Mas atenta mesmo é a câmera do Alfredo em encontrar o melhor ângulo para um bom registro. Como diz o poeta, no hino da cidade de Florianópolis, “Num pedacinho de terra, beleza sem par”.
Além da paisagem, eternizamos momentos de descontração, de cuidado e carinho. Os casais Joel e Catarina, Pedro e Dalvina, Rogerio e Shirley, Paulo e Ana, o Julmar e eu, não poupamos beijinhos e abraços neste ambiente romântico. Tenho certeza que muitos usaram o whatsapp para compartilhar estas cenas com seus amores.
Com passos firmes alcançamos a Caieira da Barra Sul, vencemos Naufragados, Pastinho e Saquinho. Muita água, bananas, sanduiches e outros petiscos ajudam a repor as energias. Uma cachacinha recupera o ânimo. Não posso esquecer os pastéis de camarão. Acredite, foram muitos.
Na Pousada Santa Ana, um churrasco organizado pelo Rogerio, Elianne e Cadinho uniu ainda mais o grupo. Maria Zilda mostrou seus dotes culinários nas saladas. O chope e a cerveja rolaram gelados. Até uma feirinha de roupas de caminhada aconteceu ali.
Entre a Solidão e a Armação do Pântano do Sul, numa trilha beirando o penhasco, vê-se a Lagoinha Leste. Por conta do difícil acesso, o ambiente se mantém isolado e preservado. O Morro da Coroa e o Dedo de Deus são formações rochosas que somente os mais preparados ousam visitar. O Matadeiro faz referência à caça da baleia que, no passado, era arrastada até esta região para ser processada. Hoje, ali se pesca tainha e garoupa. Muitos trechos são de mangue, como o em torno da Lagoa do Peri. Uma imensidão de mosquitos atacou o pelotão. A equipe se defendeu abanando com ramos, uns aos outros. Mais parecia uma dança indígena. Foi ali que a Rozi perdeu seus óculos, mas como num passe de mágica, eles reapareceram no seu nariz. Será que foi resultado da dança ou a interferência de alguma feiticeira? Afinal, o Morro das Feiticeiras fica logo à frente.
Algumas praias apresentam boa infraestrutura e são as preferidas dos turistas: Campeche, Joaquina e Santinho. Outras são mais desertas e preferidas pelos surfistas como Gravatá, Moçambique, Mole e Galheta. Os redutos de pescadores são identificados pelas casas simples, as redes estendidas no varal e os barcos descansando na areia. Cenas simples e originais. A renda de bilro também é produzida na região, em especial na Lagoa da Conceição, cultura trazida pelos portugueses.
No jantar na ASSEFAZ o grupo folclórico infantil Boi de Mamão nos brindou com uma bela encenação, iniciando as crianças no mundo do teatro. A dança do Boi de Mamão faz parte do folclore local. Personagens feitos de pano como ovelhas, cavalos e cavaleiros, ursos, causam a morte do boi de mamão (antigamente sua cabeça era de mamão). Uma benzedeira é chamada para ressuscitar o boi. Nesta brincadeira foram revelados alguns segredos da juventude de Joel e Catarina. Tudo com muito bom humor. O Henrique também aderiu à brincadeira do humorista e declarou sua paixão pela Maricota (uma mulher muito alta que bate em todos com seus longos braços enquanto dança).
Já contornando o Norte da Ilha, nosso trajeto se confunde com o Caminho Brasileiro de Santiago de Compostela que inicia na Igreja de Nossa Senhora de Guadalupe, em Canasvieiras e termina na Igreja Nossa Senhora dos Navegantes, na praia dos Ingleses. Setas amarelas, vieiras e placas sinalizam todo o trecho. Andar em silêncio pelo interior da mata é a melhor forma de apreciar este santuário ecológico.
Ingleses e a Praia Brava são ligados pela Trilha das Feiticeiras, antiga passagem de pescadores, com terreno molhado e vegetação rasteira. Pela Trilha do Morro do Rappa chegamos a Praia da Lagoinha do Norte, passando por belos mirantes com vista para o mar e bifurcações para a pista de parapente. Na sequencia, vem Ponta das Canas, Cachoeira do Bom Jesus, Jurerê e Praia do Forte. Os pescadores da região recolhiam suas redes arrastando para a praia robalos de mais de metro. Então, as histórias de pescador foram o assunto até o final do dia.
A última noite foi especial. Depois da reunião de avaliação, o jantar foi no Restaurante do Zé com uma deliciosa paelha regada a espumante. O bolo de chocolate era em comemoração ao aniversário da Ana e do Sergio. Mas quem ganhou presente foi o Paulo que apareceu de tênis novo. Depois de arrastar a botina esfarrapada o dia todo, enfim conseguiu desapegar.
Deixamos a Pousada Tatuíra comovidos com a delicadeza do atendimento. Nossos lanches continham uma mensagem, escrita a mão, sobre o caminho. Foi nesta manhã que Catarina deixou nas mãos de Cirlene o Oráculo das Virtudes, um jogo de cartas utilizado durante as reflexões da semana. Presente para a ACACSC. Cantamos ‘’Jesus Cristo’’ em agradecimento as dádivas recebidas nesta jornada. São Pedro também foi lembrado por nos conceder bom tempo e brisa fresca.
Com gosto de despedida, passamos por Sambaqui, Freguesia de Santo Antônio de Lisboa e Cacupé, bairros com característica urbana e influencia portuguesa. Passava do meio-dia quando atravessamos a Beiramar Norte, a ponte Hercílio Luz e pousamos para a foto final nas escadarias da Catedral Metropolitana de Florianópolis Nossa Senhora do Desterro e Santa Catarina de Alexandria.
Com sabor de dever cumprido, o almoço foi concluído com a entrega dos certificados. Eu vi lágrimas de comoção em muitos olhos. Fortes vínculos surgiram nesta experiência tão intensa e, certamente, foram transformadores. A corrente de amizade e solidariedade que se formou foi tão grande que poderia dar muitas voltas na bela ilha de Santa Catarina.
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